Navegando pelas comunidades do facebook eis que me deparo com esse texto: super bem escrito e coeso, fala sobre a atual realidade da odontologia e nos mostra como os tempos já foram gloriosos para nós dentistas.

O Futuro da Odontologia

Depois de ler, fica apenas aquele saudosismo gostoso e a expectativa de uma mudança para melhor.

Confiram abaixo o texto do Dr. Ricardo Righesso, dentista gaúcho de Bento Gonçalves:

Quando me formei, no longínquo ano de 1981, sendo filho de dentista e tendo meu pai seu consultório ativo, sabia que meu futuro era a seu lado e que o céu era o limite. Fiz o curso de Graduação numa boa instituição (UFRGS), automaticamente iniciei meu curso de Especialização (Periodontia, também na UFRGS) e isso por si só já era garantia de sucesso profissional.

Então, saído da graduação fui direto para a iniciativa privada. Naquela época, poucos viam as demais alternativas como rentáveis (empregos públicos ou carreira docente). Trabalhar para a Prefeitura sendo seu dentista desmerecia a carreira liberal. Os bons dentistas não tinham e não pensavam em ter empregos.

A carreira docente era para poucos. Exigia muita dedicação, mas especialmente fazer parte da panela. Aqui no Rio Grande do Sul, havia poucas Universidades e somente 5 Faculdades de Odontologia. As 5 faculdades eram verdadeiros feudos, e seus donos, só permitiam que membros do grupo participassem. Então, se você não era da panela, esta iniciativa estava descartada.

Havia sim, estou tentando lembrar, alguns bons empregos. Mas eram raros. Talvez pudesse mencionar a carreira militar. Algumas áreas onde especialistas eram bem remunerados, como no Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre. O Inss também contratava alguns dentistas, mas as vagas normalmente estavam preenchidas e não haviam novos concursos. O Sesi contratava alguns dentistas. Alguns colegas dedicavam uma parte do seu tempo prestando atendimento em algumas empresas, como funcionários, imaginando ali realizarem pequenas tarefas, obterem um salário e benefícios garantidos, mas fundamentalmente usam isso para se tornarem conhecidos e angariarem pacientes para sua clínica particular. Normalmente era isso. Mas a grande maioria, talvez mais de 90% se dedicava a clínica particular.

Ser dentista e melhor ainda, se você fosse um bom dentista, isso era garantia de uma boa remuneração. Falo de algo em torno de R$ 10.000,00 como um valor mínimo. Não raro haviam colegas que freqüentavam faixas bem maiores, com remunerações médias na ordem de R$ 25.000,00 e alguns outros, agora em menor número, mas ainda de forma significante, que orbitavam nos patamares de R$ 50.000,00 para mais.
Meu pai, que não tinha nenhum emprego, trabalhava bastante, algo em torno de 10 à 12 horas diárias, cinco dias por semana. Mas sua renda ( eu nunca soube os valores reais) deveria ser elevada pois chegou a manter 4 filhos em estudo universitário, sendo 3 fazendo o curso de Medicina, todos ao mesmo tempo e morando em outras cidades. Ainda assim, andava de carro bom e do ano ( sempre os melhores modelos) , adquiria imóveis e tirava férias com toda a família. Meus irmão acadêmicos de Medicina moravam em Porto Alegre em apartamento próprio e tinham automóvel. Convenhamos que um dentista que banca sozinho um padrão de vida como este e tem sua renda oriunda somente de sua atividade profissional deve ter um faturamento mensal muito bom.

Assim era a Odontologia dos anos 80 e 90. A partir de 2.000 eu acredito que as coisas começaram a mudar por aqui. Se eu estiver enganado talvez tenham começado a mudar um pouco antes e eu demorei a perceber.

Hoje vejo colegas, amigos dos meus filhos, egressos da Ulbra, que pagavam mensalidades próximas a R$ 4.000,00 para os últimos semestres do curso de Odontologia atuando em clínicas populares e recebendo R$ 10,00 por hora de trabalho, sem carteira assinada e qualquer tipo de benefício. Como pode alguém pagar uma mensalidade de R$ 4.000,00 e perceber R$ 1.500,00 por um mês de trabalho?

Realmente o contexto é outro. Agora com a minha nova clínica estou desenvolvendo um projeto e com a finalidade de realizar algumas pesquisas comecei a selecionar estagiário, futuros colegas, estudantes de Odontologia. Tenho perdido o sono ao perceber o que estes jovens profissionais imaginam e a dura realidade que os espera. Pensando neles e que estou escrevendo este documento.

Fruto de vários estudos tenho tentado imaginar o futuro da Odontologia. Assim cheguei a algumas conclusões:

1- Acredito que nos próximos anos os governos federal, estadual e municipal haverão de investir pesado em saúde publica. Desta forma haverá um número maior de procedimentos englobados e a prestação dos serviços odontológicos será uma prática mais comum. Vejam que nas grandes cidades já existem os CEOs (Centro de Especialidades Odontológicas) onde inclusive especialistas prestam atendimentos. Nesta alternativa não acredito que um profissional perceba mais que R$ 5.00000 para 40 horas semanais. Poderá haver exceções, mas serão exceções.

2- Os planos de saúde passarão a ofertar os serviços odontológicos aos seus associados, seja na forma de atendimentos em locais próprios ou em serviços conveniados. Vejam que a Odontoprev já abocanhou todos os funcionários ativos do Banco do Brasil e vejam os valores pagos aos profissionais que executam estas tarefas e as exigências feitas. São valores absurdamente baixos. Aqui acredito que nas grandes cidades, os planos terão seus próprios locais e os dentistas atuarão na forma de empregados via CLT e os salários serão desta ordem, algo como R$ 5.000,00 no teto. Nas cidades menores, os planos e convênios terão parcerias com as clínicas populares e os únicos felizardos serão os donos destas clínicas. Os dentistas continuarão a serem explorados.

3- Restarão sim alguns nichos, onde via concurso, alguns dentistas terão uma remuneração mais condizente, tal qual, ser dentista concursado das Assembléias legislativas, do Judiciário, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e de algumas autarquias. Mas serão poucas vagas e os concursos serão muito disputados. Aqui posso estimar uma remuneração com teto na ordem de R$ 15.000,00. Juntando todos, digas 1.000 vagas como esta em todo o país.

4- A carreira universitária também abrigará alguns profissionais, sendo que hoje lecionar numa universidade Federal paga algo em torno de R$ 6.000,00 para 40 horas semanais, ou seja, dedicação exclusiva. As universidades particulares podem funcionar como uma complementação de renda para profissionais sem outros vínculos empregatícios de concurso, então um dentista poderá lecionar em uma instituição particular e preencher o restante de seu tempo em atividades liberais. Não acredito que uma instituição particular pague muito mais que R$ 3.000,00 por 20 horas semanais. Isso exige no mínimo mestrado e algumas vezes doutorado.

5- Os consultórios particulares, aquele famoso Gabinete Dentário, onde um único dentista exerce suas atividades esta com os dias contados. Por mais hábil e qualificado que seja o colega, as clínicas dominarão o mercado. Atuando de forma mais empresarial, as clínicas oferecerão bons ou melhores profissionais, com maior infra-estrutura, tudo num único local.

Assim entendo que este será o cenário para os próximos anos. O dentista liberal será uma raridade e certamente estará nestas clínicas. Penso que para aqueles que desejam uma remuneração maior a única alternativa seja, tornarem-se tão qualificados que estarão aptos a trabalharem nestes ambientes e especialmente que desde logo tentem se aproximar de profissionais que possuam ou já trabalhem em clínicas deste tipo.

Poderíamos divagar por longas horas tentando explicitar mais este cenário. Contudo o objetivo destes escritos é alertar aos pais destes jovens, no sentido de saberem no que seus filhos estão se metendo. Não deixem seus filhos iniciarem seus estudos acadêmicos pensando nos dentistas dos anos 80 e 90. Não permitam que sua visão de profissionais como meu Pai norteiem suas decisões. O cenário é outro. Mostrem esta realidade aos seus filhos. O mercado Odontológico atual é decadente. O número de profissionais formados anualmente é maior que a capacidade do mercado em absorvê-los, logo as remunerações estão decadentes. Levará muitos anos para que isso mude.

Então se você tem um negócio próprio, se você tem um comércio, se você tem uma prestadora de serviços de relativo sucesso, não acredite que a galinha do vizinho como menos milho e engorda mais rápido que a sua. Fale com seus filhos, tente explicar o mercado atual, faça-os iniciarem cedo a luta pela sobrevivência e desta forma adquirirem condições de sobrevivência num mundo tão disputado. Hoje, se eu não fosse dentista, pensaria com muito mais cautela se deixaria meus filhos cursarem Odontologia e somente o faria depois de conhecer o cenário e ter a certeza que dispunha de tanto capital que poderia permitir que eles estudassem tanto, que seriam as sumidades do futuro.

Vejo famílias fazendo sacrifício dignos de Hércules para formar seus filhos. Alguns estudantes chegam a passar fome. Famílias se endividam por anos, pensando que estão fazendo o melhor por seus filhos. Nós os pais somos uns babacas, estamos ainda vendo o mundo com os nossos olhos e com os nossos valores. O mundo mudou. Sim, o mundo mudou. Em 1987 meu orientador, o Prof. Rolf Atströem, me disse enquanto eu estudava na Suécia, que nós cometíamos um erro grave no Brasil, pois acreditávamos que Faculdade era para dar profissão. Segundo ele, que dá profissão é curso técnico, faculdade e universidade servem para abrir a mente, para dar conhecimento.

Talvez daqui alguns anos muitos possam rir por terem perdido seu tempo lendo estes escritos, mas se não servirem para nada, pelo menos terão feito vocês pensarem, analisarem e tentarem ao menos me desmentir.

E então, o que acharam? Comentem!

#goDIVAS! GO!

 

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