O texto abaixo é do colega José Carlos Faria Lago, originalmente publicado no Facebook e que transcrevo aqui com autorização do autor. Uma opinião diferente, lúcida e madura sobre a algo mais profundo que uma propaganda na TV, mas que veio à tona por causa do tal comercial de uma marca de cerveja. Leiam e reflitam.

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Percebo que nem tudo está perdido quando vejo uma classe levantar-se unida, atingida em seus brios por possível decoro maculado e amor-próprio ferido por ameaças à própria reputação. Não tinha visto o tal comercial de cerveja e resolvi informar-me para procurar entender o que provocou tanta celeuma, e para isso consultei o YouTube. Procurei analisar a proposta daquele vídeo que trata de maneira considerada apelativa o representante de uma classe e, de imediato compreendi a reação dos colegas, não pelo teor da proposta, mas pela circunstância deste estimulo ter aportado no momento certo, no lugar certo e na hora certa para provocar esta reação vigorosa.

Não posso tirar-lhes a razão, meus jovens. É como se fosse uma gota d’água no copo já prestes a transbordar. Porém, julgo oportuno colocar em pauta algumas considerações para julgamento dos colegas, enfocando o episódio sob outro prisma. Este vídeo traduz em linguagem midiática (o cômico vende e tem alto recall) o que o vendedor quer, isto é, vender. Paralelamente, milhares de colegas DENTISTAS postam aqui no Facebook e anunciam, com os indefectíveis rsrsrsrsrs, ou kkkkkkkk!!!!!, o glorioso fim de sexta-feira que chega prenunciando aquelas tão pessoais “propostas deliciosas” do sábado libertador. Quem não trabalha pensando, antevendo e saboreando isso? Deem uma olhada nas postagens deste dia, revistam-se do espírito aí latente e tentem criar e postar em seus portais situações DIVERTIDAS a comemorar o fato. O tal vídeo considerado afrontoso pode ser interpretado dessa forma, caso fosse construído “intra muros”, ou por nós mesmos. Porque uma sequela positiva (não são muitas) que vieram junto aos poucos cabelos brancos que me restaram, é que aprendi a compreender um pouquinho as circunstâncias das motivações humanas, a afastar a ira do touro à vista da capa vermelha por entender a armadilha como teste à maturidade.

Colegas, muito cuidado, porque reação exacerbada a este tipo de estímulo considerado como provocação deixa entrever indisfarçável complexo de afirmação social e sem o fair play de quem sabe o que vale e representa na sociedade. Não se esqueçam de outra informação: o cirurgião-dentista foi muito bem cotado na lista das profissões mais confiáveis. Sim, somos dignos e temos o respeito da sociedade. Observem como aquele indivíduo que, ao recusar um apelido por julgá-lo ofensivo, repele-o energicamente e em consequência nunca mais dele se livra, justamente por perceberem ali um ponto fraco? E este pega porque os que estão à volta percebem a fraqueza e divertem-se com sua aflição? O que pensará o público que nos elegeu na enquete citada a respeito de algo que nos afronta tanto? Afinal, já pensaram na interpretação do público leigo? Aquele mesmo que ri daquele humor televisivo em que machões fogem espavoridos à vista dos dedões do médico urologista a chamá-los para o exame prostático? Os médicos provavelmente também riram, pois sabem o quanto valem para sentirem-se arranhados por tão pouco.

Colegas, peço-lhes que não se agastem tanto com o episódio, vamos desmerecê-lo simplesmente ignorando-o, vamos abandonar este comportamento de vestal enclausurada na defesa de sua dignidade violada e voltar nossos olhos para aquilo que realmente denigre, choca, vilipendia e desmerece a classe: as ofertas de serviços por preços vis, as propagandas oferecendo brindes, descontos, promoções, a passividade frente aos abusos de fabricantes que alardeiam recursos inexistentes em seus produtos, além do pior deles, o trabalho escravo de subserviência a planos de saúde conduzidos por forasteiros à classe, que dela tira sangue, suor e dignidade. Contra isso, sim, vale a pena combater, dedicando vocês, jovens, todo o entusiasmo e vigor. Vivam a vida com dignidade e honrando a profissão, podendo ao cabo dizer, parodiando o apóstolo Paulo, “combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé”.

Aceitem um abraço.

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