Você já atendeu pacientes HIV positivo no seu consultório? Pode ter certeza. Mesmo que você não se recorde de nenhum caso em específico, esteja certo de que, no mínimo, você fez um exame clínico em algum. Isso porque, seja por medo, por vergonha, ou por achar que você não tem nada a ver com isso, alguns pacientes mentem durante a anamnese.
Lembrando: paciente HIV positivo e paciente com AIDS são coisas diferentes. Estar com AIDS pressupõe a manifestação do vírus HIV, o que nem sempre acontece.
Mas se o paciente mente e não há nenhuma manifestação bucal que me faça desconfiar da doença, como me proteger adequadamente durante o atendimento clínico? Ora, o protocolo de biossegurança não muda! Já dizia um professor meu da época de faculdade: atenda seus pacientes (do ponto de vista da biossegurança) como se TODOS ELES fossem HIV positivo. Não se pode negligenciar o uso de EPIs por achar que alguém oferece mais ou menos risco de contaminação por qualquer doença, até porque é sabido que a chance de contaminação do profissional (ou contaminação cruzada) dentro de um consultório odontológico é muito maior para outras doenças, como a hepatite B e C, por exemplo.
Mas consideremos que durante o exame clínico e/ou anamnese o paciente revela: “tenho AIDS”. E aí? Somos obrigados a atender? Legalmente, não. Aliás, não somos obrigados a atender nenhum paciente, e fazemos isso rotineiramente quando encaminhamos nossos pacientes para colegas. Não faço endo, encaminho para o endodontista. Não faço implante, chamo o implantodontista. Não me sinto seguro para atender um paciente HIV positivo? Encaminho para um colega que eu acredito ser mais capacitado que eu, com a aprovação de ambas as partes (paciente e dentista), claro.
E é inevitável falar de paciente HIV positivo e não falar em sigilo profissional, considerando a carga de preconceito que essa condição carrega. Segredo pode ser definido como “o dever e o direito que todo indivíduo tem de manter oculto algo que assim deva permanecer”. Ele é protegido por lei e sua quebra é crime. O segredo pertence ao paciente, o cirurgião-dentista apenas possui a sua guarda. E aí… posso contar pra alguém que o paciente é HIV positivo?
Depende. O CEO coloca o segredo profissional como dever fundamental do cirurgião-dentista, porém reconhece a existência de justas-causas (grifos meus).
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida é uma doença de notificação compulsória, segundo a Portaria Nº 5 do Ministério da Saúde, de 21 de fevereiro de 2006. Nesse caso há uma causa que justifica a quebra de sigilo mas, claro, isso não deve causar nenhum tipo de constrangimento ao paciente.
Veja que interessante a questão do último concurso para cirurgião-dentista da Prefeitura Municipal de Curitiba:
Embora a notificação compulsória se aplique ao paciente HIV positivo, o Art. 269 do Código Penal diz que não pode “… deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença, cuja notificação é compulsória”. A pena é de 6 meses a 2 anos + multa. Porém, não se aplica diretamente ao dentista, não há para nós sanção penal, pois nossa obrigação é mais de cunho “moral” do que legal (como no exemplo da questão acima, o que constitui fato moralmente relevante).
O fato é: o paciente HIV positivo que não informa ao seu dentista sobre a sua condição coloca sua própria vida em risco. Lembro ainda que é lícito ao cirurgião-dentista solicitar o exame de HIV, desde que o paciente concorde.
E você, colega que teve paciência de ler até aqui, o que acha? Qual a sua experiência no atendimento de pacientes HIV positivo? Ou você costuma encaminhar? Comente! 😉
Um ótimo livro sobre o assunto –> Abordagem Odontológica da Criança Infectada pelo HIV – Ivete Pomarico Ribeiro de Souza e Gloria Fernanda Castro
Veja também:
Estamos preparados para atender soropositivos? no Vida de Dentista
A Odontopediatria e as Crianças com AIDS no Tio Dentista
Acho ridículo o fato de negar atendimento a portador de doenca infecciosa, passei por constrangimento quando sentei na cadeira do dentista e após ele ver minha ficha e constatar que era portadora de hepatite c dizer que não podia atender, sendo que eu estava em um pronto socorro, sinal de que estava com muita dor… e nada foi feito na hora para amenizar minha dor.
Jaqueline, se não houve nenhum motivo relativo ao seu estado de saúde no momento do atendimento (pressão alta, diabetes descompensada, etc.), não há explicação para o não-atendimento, mesmo. O dentista explicou o motivo de não poder atendê-la? Se foi “porque você tem hepatite C” e de forma geral você estava ok, revela despreparo da parte dele.
[…] Em segundo lugar: Odontodivas – “Atendendo pacientes HIV positivos“ O grande vencedor : Medo de Dentista – “Na minha mão é mais barato” […]
Tenho uma certa experiência em pacientes portadores do vírus HIV e pacientes com doença AIDS. Sou especialista em pacientes especiais e sempre atendi muito paciente encaminhado da Infecto. Enfim, quanto a biossegurança, nada de diferente a fazer, como já foi dito no post.
O que eu acho mais grave é quanto se manter o sigilo, ainda mais quando o atendimento é no serviço público, onde o prontuário pode ficar mais acessível. Já tive um problema grave com isso (nao em o paciente ser HIV, mas com o paciente, que era HIV+ e transexual, o qual ninguém na cidade sabia seu nome de batismo, e o nome vazou pelo prontuário…).
Outro problema que é pouco debatido, porém acho que deve ser enfatizado. O maior risco do CD nao é atender HIV+, e sim a Hepatite C. Esse é gravíssima e bem mais fácil de se contrair com um acidente perfuro-cortante. Acho que isso seria um bom tema para posterior postagem.
Até mais,
@diegoperes.
[…] Atendendo pacientes HIV positivo. –> OdontoDivas […]
Quando há 16 anos perguntei a um ex professor qual a conduta frente ao paciente que revelou ser Soropositivo, a resposta dele, me norteia até hoje: “Vc pode se negar a atendê-lo (o proprio pac. tinha me deixado livre pra isso); ele vai procurar outro colega, e se for rejeitado novamente, pra o terceiro ele nem vai contar, e o nosso risco aumentaria exponencialmente.
Atendo este há 16 anos. É consciente e se trata corretamente. Tem bom estado geral oral, mas recentemente começamos a perceber o aparecimento de xerostomia. O índice de cárie, e o desgaste das resinas tbem se acentuaram.
Outros casos já passaram pela minha mão, e felizmente sempre bem conscientes e controlados. Endo e implante com sucesso total.
Ironicamente este quadro tem dado a falsa impressão de que a AIDS não é tão grave assim.
A cada tres dias um jovem brasileiro é diagnosticado com AIDS.
Onde eu atendo, as normas de biossegurança são as mesmas para todos.
Bjo
Muito bom! Li tudo tá? hahaha
Estou na graduação ainda e já ouvi a mesma coisa de diversos professores, ‘atenda como se todos fossem infectados, seja pelo HIV ou alguma Hepatite (que não assusta tanto ao falar, mas tem contágio mais fácil)’, do ponto de vista da biossegurança.
Agora imagina quem enfrenta ainda as primeiras clínicas da graduação, que mal sabe tratar um paciente, digamos, “Saudável”, como é com um paciente nessas condições?
Obrigada pela audiência e pela paciência, Murilo! 🙂
Sem falar que as Hepatites (B e C) são bem mais difíceis de tratar, muito mais contagiosas e matam tanto quanto a AIDS. Infelizmente, os avanços científicos se focaram exclusivamente no HIV em detrimento de outras viroses já velhas conhecidas e de outros agentes patológicos. Gripe ainda não tem cura; Hanseníase, Tuberculose, Leptospirose, Toxoplasmose, etc., ainda colecionam vidas mundo afora.