Hoje quero falar de um assunto delicado. Delicado não pelo tema em si, mas pela discussão que ele tem gerado nas redes sociais: a recente parceria entre a OSCIP Turma do Bem (TdB) e a Amil Dental, convênio odontológico.

De ambos os lados da questão vemos ânimos inflamados. Numa época em que a classe odontológica se rebela contra as aviltantes tabelas de honorários que certos convênios oferecem aos seus dentistas credenciados é realmente de se causar estranheza uma parceria desse tipo. Por isso mesmo, acho importante refletirmos sobre o tema antes de emitirmos opinião.

Em tempo: não sou e nunca fui voluntária da TdB. Não sou e nunca fui credenciada a qualquer convênio odontológico. Se serei um dia, tanto uma coisa ou outra, não sei. Sou apenas uma dentista tentando entender o impacto dessa associação na vida das pessoas, dentistas ou não.

“Convênio paga mal”, o senso comum eugenólico diz. É verdade (generalizando), mas isso tem um motivo: os convênios são atravessadores, eles ficam exatamente no ponto médio entre o dinheiro do paciente e o dentista, e NUNCA pagarão tão bem quanto o atendimento particular porque uma parte do faz-me rir vai ficar com eles. Isso não faz deles, necessariamente, entidades demoníacas. Mas, pra quem os vê assim, sempre há a opção do vade retro, Satanás! Se você acha que o convênio não remunera à altura, não atenda pacientes de convênio. É simples, a gente é que complica. E não adianta ficar bravo com o colega do consultório ao lado que atende, porque é um direito dele. Um dos aspectos mais libertadores da nossa profissão é justamente o fato de nós mesmos definimos os nossos honorários. Quando um dentista aceita receber muito pouco pelo seu trabalho ele não desvaloriza a classe toda, mas apenas a si mesmo. Eu não me sinto desvalorizada pelo “preço” dos outros, pelo menos.

Numa briga, sempre alguém bate e alguém apanha.

A TdB agora é parceira da Amil Dental. Pra entender o que isso significa, dei uma passada no blog do Dr. Fábio Bibancos. Lá ele explica que essa parceria, projeto que recebe o nome de Apolônias do Bem, levou mais de um ano pra sair. A TdB é conhecida e reconhecida por oferecer atendimento odontológico gratuito a crianças e adolescentes de baixa renda e, graças à parceria com um convênio odontológico, vai oferecer atendimento também a mulheres vítimas de agressão doméstica. A Amil vai arcar com todos os custos do tratamento, que será realizado pelos dentistas credenciados na rede da operadora. Os dentistas voluntários da TdB farão a triagem e o encaminhamento. Em resumo: a operadora vai estender a 200 pessoas (no primeiro ano), triadas pela TdB, seu convênio odontológico. Os dentistas já credenciados, voluntários da TdB ou não, atenderão essas pessoas e receberão por isso.

Pergunto: qual o problema?

Eu posso ter deixado escapar algum detalhe, mas não enxergo nada de errado. Não vejo prejuízo algum para a classe odontológica. O que eu vejo são 200 pessoas recebendo cuidados odontológicos, os quais, de outra forma, não receberiam. Você pode não gostar do fundador da OSCIP e/ou da forma como ele administra sua turma, e pode achar que intitular-se Dentista do Bem é arrogante e coloca os outros dentistas na “esfera do mal” (coisas que escuto por aí). Eu mesma me assusto às vezes com a forma como ele reage quando confrontado nas redes sociais… mas gente, temos que admitir: a TdB leva saúde pra quem mais precisa. Não dá pra levar para o lado pessoal. Assim como acontece com os convênios, você não é obrigado a fazer parte da TdB. E, se você não concorda com a nova parceria, é um direito seu, atual voluntário da TdB, desvincular-se da OSCIP. Até porque ajudar o próximo não requer inscrição em qualquer entidade.

Enfim, eu acho que a palavra chave deste texto é impacto. Qualquer impacto negativo que essa parceria traga para a profissão (se é que traz) não se sobrepõe ao impacto positivo na vida de 200 mulheres. Nem se fossem 100. Nem se fossem 20. Nem se fosse apenas 1.

Concorda? Discorda? Comente.

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